O Recomeço em Milão

Estamos em setembro: feliz ano novo! É assim que estou me sentindo há alguns dias, com a vida fora de casa sendo retomada aos poucos. O verão milanês foi mais leve este ano e está indo embora mais cedo também. É o momento perfeito para o recomeço. Embora a incidência do coronavírus já estivesse bem baixa na Itália desde junho, era o auge do verão: nada iria recomeçar durante as sagradas férias, principalmente depois de uma fase tão difícil. Tradicionalmente, Milão se esvazia em agosto: quem pode, vai pra praia. Quem não pode, dá um jeitinho e vai também! A cidade fica às moscas. Nos bairros residenciais, a maior parte do comércio fecha – inclusive as padarias! Demorei um pouco para me acostumar a esse ritmo.

Bosco Verticale-Um ícone arquitetônico de Milão

Neste ano, depois dos quatro meses que passamos no Brasil, devido à suspensão dos vôos para a Europa, decidimos não entrar em um trem ou um avião tão cedo. Assim sendo: a cidade ficou toda para nós, as moscas que ficaram em Milão em agosto! Até o entrave das padarias fechadas eu acabei superando: agora ando fazendo meu próprio pão! Quem aí já fez pão? É uma sensação de poder inigualável! A casa fica com um cheiro incrível, acolhedor, você sabe exatamente os ingredientes que estão ali e, sobretudo, você fica com a plena convicção de que poderia sobreviver mais facilmente em caso de um novo lock down...

Mas como tudo o que vai, volta, os milaneses começaram a voltar das férias, as escolas estão reabrindo depois de 6 meses e, como não poderia deixar de ser, comecei a sentir a verdadeira Milão... de volta! Igualzinha? Ligeiramente… comecemos pelo trânsito: um número muito maior de bicicletas, motos e patinetes (acho patinete um perigo sem tamanho no meio do trânsito, mas fazer o quê...).

Acredito que muitas pessoas que antes utilizavam o metrô ou os ônibus andam optando por esses meios. As bicicletas já eram bastante utilizadas por aqui. Sempre gostei de observar as pessoas elegantíssimas indo trabalhar de bicicleta, com a bolsa (mais cara que a própria bicicleta) na cestinha! Isso é Milão sendo Milão novamente!

Outro ponto importante são as máscaras. Aqui não está sendo obrigatório usá-las ao ar livre, mas sabem o que está acontecendo? As pessoas estão usando mesmo assim! Acredito que, em parte, pelo trauma de uma região que enfrentou a pandemia de uma maneira muito forte e, outra, pela responsabilidade e respeito aos demais. Percebo, também, que as pessoas buscam estar afastadas umas das outras enquanto esperam para atravessar a rua, o álcool gel está na porta de absolutamente todos os estabelecimentos comerciais e a gente acabou se acostumando com tudo isso. Simples assim.

Estão garantindo que a retomada é pra valer: não vão fechar de novo. O retorno das férias trouxe muitos casos positivos de coronavírus novamente para a Lombardia (onde está Milão) e para o Vêneto (onde fica Veneza), ambas ao norte e com o maior número de infectados na Itália neste momento; felizmente, apesar desse aumento, não houve ainda um aumento significativo no número de internações, nem de mortes. Alguns grandes eventos também já estão sendo retomados, como o Festival de Cinema de Veneza e, no final do mês, será o grande retorno da Fashion Week. Até a Valentino, grande marca que há anos não desfilava mais em Milão, resolveu deixar Paris e “voltar pra casa”…

Fiquei lembrando dos comerciais brasileiros, no auge da quarentena, que repetiam toda hora “isso vai passar”. Ainda não sinto que tenha passado; acredito que continuamos sem saber de nada, porém mais experientes em beirar o caos. Até mesmo o contágio de gripes e resfriados no próximo inverno deveriam diminuir, segundo alguns especialistas, já que agora sabemos nos proteger melhor.

Diante de tudo isso, só espero que encontrem uma solução efetiva para o destino das máscaras descartáveis que estão sendo usadas todos os dias no mundo todo. Só para as escolas da rede pública, o governo italiano vai destinar 11 milhões delas por dia... Será que já começaram a pensar nisso? Se não, é melhor começar...